O game brasileiro "Starlit Adventures" surgiu nos smartphones no final de 2015, mas está cada dia mais longe de ser apenas um joguinho de celular.
O título do estúdio gaúcho Rockhead Games chegou na terça-feira (10) ao PlayStation 4, nesta que é só uma fase na missão da empresa e de seus parceiros de transformá-lo na franquia que quer ser o "Angry Birds" brasileiro.
Isso porque os mais de 10 milhões de downloads do jogo, entre aparelhos Android e iOS, foram só o pontapé inicial de uma marca que já inclui outros games, histórias em quadrinhos, e que planeja o lançamento em 2019 de uma série de TV com orçamento de US$ 2 milhões.
Entenda o projeto do 'Angry Birds' brasileiro:
- Mais games: "Starlit Archery Club" foi lançado em dezembro de 2017 para celulares e se passa no mundo de "Adventures", mas com mecânicas totalmente diferentes
- Ainda mais games: dois outros jogos da marca "Starlit" estão previstos para 2018, segundo a Rockhead. Um de corrida, em maio. E outro para o público infantil, no segundo semestre
- No controle e com amigos: a versão de PS4 foi produzida em parceria com o estúdio paulistano Webcore Games e tem um modo multiplayer inédito para até 4 pessoas
- Na tela da TV: a animação de "Starlit Adventures" prevê 52 episódios de 11 minutos cada. O estúdio produz a série e negocia sua exibição com emissoras
A ideia é ambiciosa, mas alcançável, segundo Rodrigo Scharnberg, o "Chips", produtor da série de "Starlit Adventures".
"Em uma entrevista, o CEO da Rovio [criadora de 'Angry Birds'] disse que o objetivo da empresa é ter uma marca mais conhecida que 'Super Mario'. Na época, pensei que ele estava totalmente fora da realidade. Hoje entendo que é uma coisa viável", diz "Chips" ao G1.
"É óbvio que não tivemos o 'boom' de um 'Angry Birds', então trabalhamos no dia a dia com uma escala de crescimento menor. Mas isso só significa que vamos levar um pouco mais de tempo. Estamos olhando para 2020, 2021, quando a série estiver na segunda temporada, com mais jogos".
Tem que durar mais
Mas o que leva um game de celular em que o objetivo é escavar até o final da fase, derrotando inimigos e coletando dinheiro no caminho, e feito, na época, por apenas cinco pessoas, a ganhar status de franquia milionária, com sequências e universo expandido?
Basicamente, a obrigação de pagar as contas.
"Surgiu a necessidade de se ter um produto funcional, que dure mais tempo. Que seja lançado em 2015, mas que continue sendo jogado em 2016, em 2017", afirma "Chips".
O produtor diz que a ideia parece óbvia, mas que "se fosse mesmo, todos estariam fazendo". É uma abordagem de marcas que ele atribui aos fundadores da Rockhead, ex-funcionários da Ubisoft.
"A coisa mais clara para uma empresa multinacional é que é muito caro criar uma marca nova, um jogo novo", conta "Chips".
"Então criamos um personagem que as pessoas se identificam. Daí continuamos fazendo os jogos que queremos, diferentes uns dos outros. E colocamos a roupagem por cima".
"Hoje temos um universo bastante consolidado. São cinco anos em cima desse projeto. Já sabemos exatamente o que acontece, como a gravidade funciona, como as pessoas envelhecem", brinca.
Números estelares
"A gente vê muito estúdio brasileiro com um jogo bom, uma marca legal, um personagem bacana. Mas que no próximo jogo faz tudo diferente e não aproveita nada", diz Fernando Chamis, diretor da Webcore, estúdio que trabalhou na adaptação de "Starlit Adventures" para PS4.
"O Brasil tem essa falta de construir propriedades intelectuais fortes", conta.
Versão de PS4
Durou cerca de sete meses o trabalho de adaptação de "Starlit Adventures" para PS4 na Webcore, estúdio de São Paulo.
A princípio, seria feita apenas a conversão das tecnologias usadas no game de celular para as do console da Sony. Mas a produção acabou crescendo e gerou um modo multiplayer onde até quatro pessoas escavam e cumprem os objetivos do jogo, mas sempre tentando se ajudar.
"Foram cerca de dois meses de trabalho só nessa parte", diz Chamis. "Quando começamos a mexer no cooperativo, vários problemas surgiram dentro do game. Foram envolvidos profissionais de game design, programação e design de interfaces".
No PS4, "Starlit Adventures" segue o modelo de negócios do seu primo portátil: um game gratuito para jogar (ou "free to play"), mas que se monetiza a partir de comprinhas de roupas e moedas, as chamadas microtransações.
Isso não irrita o público?
"Muitos games são lançados e com certeza queremos jogar todos. Mas eles são caros. E apesar dos trailers, de 'demos', não tem como jogar um game inteiro antes de comprar", diz Chamis.
"Acredito que o modelo 'free to play' seja bacana por isso. A pessoa pode jogar um tempão, gostar bastante do game. E só depois, se quiser, investir em novas roupas, em 'tokens' para avançar de forma mais fácil. Pra um jogador que é mais casual isso também é interessante".
Fazer um jogo assim é mais fácil?
"Acho totalmente o contrário. Porque você tem ideia do tamanho de um jogo premium. Ele tem 10 fases, um gameplay de 40 horas e vai custar R$ 59, por exemplo. O jogador pagou, acabou", diz o diretor da Webcore.
"No game 'free to play' , as pessoas esperam que ele seja expandido com mais conteúdo. A gente até brinca que quando você lança um jogo 'free to play', você chegou na metade do caminho", afirma Fernando Chamis.
"A outra metade é seguir criando conteúdo pras pessoas continuarem jogando e, obviamente, falando do lado financeiro, terem mais possibilidade de gastar dentro do jogo. É muito difícil pra uma empresa nacional lançar um jogo 'free to play' com muito game bom, gratuito, e com tanto conteúdo por aí".